segunda-feira, 4 de abril de 2011

A LIBERDADE VISTA DE COSTAS


Por José Maurício Guimarães

Imaginem-se sobrevoando o Porto de New York e espichem o olho para a Estátua da Liberdade. Que espécie de liberdade é essa? Com L maiúsculo ou minúsculo? Varia... 
Dizem que Santo Agostinho cunhou a frase: "Quem é bom, é livre, ainda que seja escravo; quem é mau, ainda que seja livre, permanece escravo." Não quero me aprofundar nas metafísicas desse santo homem, mas divirjo com um pé atrás; li apenas (e mal) parte das Confesiones, o De Magistro e De Libero Arbitrio onde não vislumbrei essa frase do Abençoado Doutor. Pode ser uma passagem dos Soliloquiorum, dos Apologéticos ou do Enchiridion, ad Laurentium... Se for autêntica, divirjo com dois pés atrás, pois entendo a Liberdade, antes de mais nada e ainda que tardia, como o amplo direito de ir e vir. Amplo porque, mesmo encarcerado numa cela subterrânea, o infeliz tem o direito de ir do catre até à parede oposta da masmorra e vice-versa. Mesmo um cão cruelmente acorrentado pode ir e vir de um a outro ponto do terreiro na extensão que lhe permita o pesado grilhão. Montesquieu disse que a Liberdade é o direito de se fazer tudo aquilo que as leis permitem. Ora essa, Montesquieu! uma liberdade circunscrita e demarcada por leis escritas não é Liberdade, é obediência... Essas falsas liberdades! – ditas, não ditas e constantemente perpetradas - são o mal secreto do nosso tempo, infortúnio análogo ao descrito por Raimundo Correia, "quanta gente que ri, talvez existe, cuja a ventura única consiste em parecer aos outros venturosa!"... ou parecer aos outros ser liberta.

Frases de efeito, discursos e arroubos de imaginação agitam-se por cima e acima da palavra Liberdade. A tal ponto, que o escultor Frédéric Auguste Bartholdi idealizou uma estátua com esse nome francês - Statue de la Liberté, presenteada pelo governo da França aos Estados Unidos em comemoração ao centenário (1876) da Declaração da Independência e virou The Statue of Liberty. Frédéric Auguste Bartholdi era maçom e foi tomado de inquietação sobre essa coisa abstrata – a Liberdade com L maiúsculo. E carregou no concreto: são quase 93 metros de altura (um prédio de aproximadamente 28 andares). Sobre a cabeça da estátua, um diadema e dilema atroz da sabedoria: sete inefáveis espigões. Frédéric vestiu a estátua com a túnica inconsútil dos inocentes e o manto virginal trespassado da esquerda para a direita.  Uma tocha iniciática na mão direita erguida sobre a cabeça e um LIVRO, na mão esquerda, apoiado sobre o coração. O Irmão Frédéric sabia das coisas: só pode erigir luz acima da cabeça quem carrega o conhecimento perto do coração. Bela frase, hem? E mais: Frédéric não hesitou em colocar na escultura o maior amigo da Liberdade - o LIVRO, contra o qual lutam os déspotas, os tiranos e os que, com palavras melífluas, desgovernam as instituições deste mundo. Mas, afinal: que livro é aquele nas mãos da estátua? Um exemplar da Bíblia? ou do Corão? o Sepher Yetzirah ou a Torah? "A origem das espécies" de Darwin ou "A interpretação dos Sonhos" de Freud? (talvez Freud, visto que a Liberdade ainda é sonho, libido, inconsciente e repressão). Um amigo meu aposta em três outros títulos: "A riqueza das nações" de Adam Smith (para ser lido na Wall Street); o "D. Quixote" de Cervantes ("a Liberdade é quimera, moinhos-de-vento"); e a "Teoria da relatividade" de Einstein (tudo nesse mundo é relativo!).

Livro e Liberdade... sempre achei curiosa a semelhança dessas palavras: em português, livro/livre; em francês, livre/libre; em espanhol, libro/libre; em italiano, libro/libero... será coincidência? coisa combinada? conspiração? final dos tempos?! Tranquilizem-se, pois o significado mais inquietante da obra do Irmão Frédéric Auguste Bartholdi  é que a estátua está andando. Imaginem-se, pois, num helicóptero a sobrevoar desde Jersey City em direção à entrada do Porto de New York. Contemplem a Liberdade vista de costas. Há evidente marcha cerimonial. O pé direito mal toca o pedestal. A liberdade não é estática, prossegue andando, talvez em direção em direção à Verrazano-Narrows Bridge. A Liberdade é uma ponte sobre muitas águas.

José Maurício Guimarães é Bacharel em Direito pela Universidade Federal de M.G. e Professor. Membro da Loja Inconfidência nº 47 jurisdicionada à Grande Loja Maçônica de Minas Gerais. Venerável Mestre da LOJA MAÇÔNICA DE PESQUISAS QUATUOR CORONATI PEDRO CAMPOS DE MIRANDA também jurisdicionada à Grande Loja Maçônica de Minas Gerais. Membro da ACADEMIA MINEIRA MAÇÔNICA DE LETRAS, Cadeira nº 39. Inspetor Geral Grau 33 do Supremo Conselho do Grau 33 da Maçonaria para a República Federativa do Brasil. Maçom do Arco Real Inglês (Capítulo 51 Belo Horizonte) Grande Bibliotecário da Grande Loja Maçônica de Minas Gerais. Membro da Escola Maçônica Antônio Augusto Alves de Almeida da Grande Loja Maçônica de Minas Gerais.

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