Por  DOUGLAS MENEZES
                                           
ORFANDADE
                            “A menina de preto
ficou morando atrás do tempo/ sentada no banco, debaixo da árvore / recebendo
todo o céu nos grandes olhos admirados. / 
Alguém passou de manso, com grandes nuvens no vestido, /  e parou diante dela, e ela, sem que ninguém
falasse, murmurou: A MAMÃE MORREU. /  Já
ninguém passa mais, e ela não fala mais, também. / O olhar caiu dos seus olhos,
e está no chão, com as outras pedras, / escutando na terra aquele dia que não
dorme / com as três palavras que ficaram por ali”. ( Cecília Meireles)
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    E essa melodia é evidenciada na assonância do
seu poema Orfandade, materializada na repetição da vogal E (alguém, ninguém).
Outro elemento que nos indica musicalidade se refere à Aliteração, concretizada
na consoante P (passam, parou, passa), o que confere um ritmo regular, próprio
da música, embora com a métrica instável, marca do Modernismo.
     Ainda vislumbramos uma outra presença que
configura sonoridade e empresta uma beleza plástica fundamental ao texto.
Trata-se dos dois últimos versos: “ Escutando na terra aquele dia que não
dorme/  Com as três palavras que ficaram
por ali”. A terra, junto com as pedras, como que repetem a frase constantemente:
“ A mamãe morreu”.
      A primeira imagem forte do texto diz
respeito à visão de que morar atrás do tempo é, na verdade, viver de memória.
Daí, já sentirmos ser o texto profundamente introspectivo, apesar do “eu
lírico” apresentar-se na terceira pessoa.
      Depois, visualizamos a cor branca da
espiritualidade, presente no primeiro verso da segunda estrofe: “Alguém passou
de manso, com grandes nuvens no vestido”.
       O poema Orfandade, expresso quase que
totalmente por Figuras de Linguagem, mostra em termos de conteúdo, confirmando
nossa análise, aspectos bastante encontrados na estética simbolista, como o
pessimismo, confirmado  pelo fato
negativo passado por alguém que perdeu a mãe; o sentimento de solidão (“Já
ninguém passa mais”); e a forte imagem associada ao Simbolismo, expressa na
presença da Sinestesia, que capta elementos sensoriais, como forma de ligar o
ser à natureza e a seus sons: “ O olhar caiu (visual); Escutando na terra
(auditiva)”. Além de tornar concreto, elementos abstratos, ao misturar as
palavras com as pedras, e a terra.
          No mais, a imagem geral de que a dor
nunca dorme, nunca acaba, estará sempre como marca da vida: “Aquele dia que não
morre”.
   Fevereiro de 2013.
Douglas Menezes é membro da Academia Cabense de Letras.

 
 
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