"É errado pensar que o amor vem do companheirismo de longo tempo ou do cortejo perseverante. O amor é filho da afinidade espiritual e a menos que esta afinidade seja criada em um instante, ela não será criada em anos, ou mesmo em gerações." Khalil Gibran
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
QUE PROGRESSO É ESSE?
Quem viveu a infância e parte da juventude freqüentando a praia de Gaibu, com sua rústica paisagem, seu visual poético, seu silêncio só quebrado pelo canto das ondas e a conversa do vento, seu ambiente bucólico, com ainda vegetação intocável e seu arruado de casas de pescadores, nativos e alguns veranistas, não deixa de ficar, hoje, desapontado com o clima sufocante e o ar poluído do ex-paraíso.
Como dói observar um amontoado de casas e apartamentos convivendo já com algumas favelas e o crescimento desordenado que compromete a qualidade de vida. Gaibu perdeu a total identidade, é mais uma vítima da insaciável exploração imobiliária e da falta de planejamento por parte do poder público. Infelizmente esse mal que aflige todo o país, terminou contaminando nosso cartão-postal.
Lembro, e a memória não mente, as excursões a pé até a praia, passando pelo engenho Garapu, Boa Vista e a mata do Boto. O intenso cheiro de manga e caju, o aroma pesado e puro da selva, esfriando o clima, pureza que agora é quase só lembrança. Naquela época, os homens imaginavam que progresso seria devastar, lotear, fazer dinheiro a qualquer custo. Se mudou um pouco a consciência hoje, parece-me tarde, irremediavelmente tarde.
Recordo, a gente pensava serem os usineiros a pior coisa do mundo como empresários. Não se podem negar o conservadorismo, o tratamento desumano para com os trabalhadores da palha da cana e a gananciosa visão escravocrata dos donos de usina.. Eu via,ainda menino, os caminhões passando pela rua da matriz, final de tarde, cheio de trabalhadores tristes, voltando de uma jornada estafante e sem dinheiro no bolso. Mas ali já havia uma luta para que um dia a vida melhorasse para aquele povo. Os usineiros não eram bons, porém deixavam a paisagem intacta, cheiro doce dos canaviais e das frutas.
Mudaram os tempos.E com eles uma revolução necessária para que a região não estagnasse. Realmente um sopro de desenvolvimento que aqui chegou fez bem ao cabo de Santo Agostinho, a vida das pessoas mudou, com certeza para melhor. No entanto só se viu um lado. A cidade não foi planejada, sofreu por isso nossa maior riqueza ecológica: o litoral. Inevitável a explosão imobiliária. Loteamentos em profusão sem que se pensasse no desenvolvimento sustentável. A ignorância e o desejo de lucro impediram a convivência harmônica entre a natureza e o progresso.
Dizer que se vive bem em Gaibu, é desconhecer as preocupações do mundo em relação ao meio ambiente hoje.É não enxergar a crescente violência, a falta de lazer cultural, as drogas, a poluição sonora, de quem acha que barulho é melodia e a devastação das matas, rios e córregos, apesar das vozes que protestam. É não sentir a ausência do nativo: expulso ou forçadamente adaptado ao novo momento. Gaibu que eu conheci, agora é tão-somente um pedaço de memória, é algo que a mente retém e que faz os olhos chorarem de saudade.
Douglas Menezes é professor, escritor e membro da Academia Cabense de Letras.
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